A histeria antissemita

A histeria antissemita

A histeria antissemita não pode ser explicada de forma natural

Israel começa a sua história oficialmente pela ocasião do chamado de Abraão, conforme relata o capítulo 12 do livro de Gênesis. Ali, por volta de dois milênios antes de Cristo, na cidade de Ur dos Caldeus, na região da Mesopotâmia, Deus escolhe um homem para dar início a um projeto. Alguns pontos preliminares devem ser colocados. Em primeiro lugar, a questão da descendência. Abraão era filho de um homem chamado Terá, que pertencia à linhagem de Sem, um dos filhos de Noé, a partir de um de seus filhos, Arfaxade. Dessa linhagem provém o termo “semita” ou seja, descendentes de Sem. O que chama à atenção é que Sem teve outros filhos além de Arfaxade, ascendente de Abraão, e que também deram origem a outros povos, como ocorreu com todos os netos de Noé. Foram ele: Elão, Assur, Lude e Arã, além, é claro do próprio Arfaxade. Vamos exemplificar um caso, somente. Segundo Josefo: “De Elão, o mais velho, vieram os elameenses, e dele os persas tiveram sua origem” (Flávio Josefo. A História dos Hebreus. 2017. CPAD.). Ou seja, há vários povos de origem semita na história, então por que só Israel é associado ao semitismo?

Em segundo lugar, temos as sucessivas nomenclaturas que se sucederam ao longo da história para designar o povo original de Deus. Abraão era hebreu, e durante muitos séculos esse era o nome que identificava a linhagem que se originou nele. Em seguida veio seu filho Isaque, e depois seu neto Jacó, que teve seu nome modificado por Deus para Israel. O nome Israel não nasceu como uma nação, especificamente, mas como o nome de um homem.

Jacó teve doze filhos, que ficaram conhecidos como as doze tribos de Israel, de onde, de forma mais objetiva, podemos dizer que nasceu a nação israelita. Dentre esses doze filhos havia um chamado Judá, que recebeu do pai a bênção da realeza, o que, associado ao fato de que na divisão das tribos, o que viria acontecer tempos depois, ele se tornou junto com Benjamim o Reino do Sul, tendo Jerusalém como capital, fez com que os modernos filhos de Israel fossem chamados de judeus, ou seja, os da tribo de Judá, muito também em referência ao Machiach (Messias) aguardado, que necessariamente pertence a essa tribo.

É importante ressaltar que, embora a descendência profética de Abraão passe pelo seu filho Isaque, o “Filho da promessa”, este não foi seu único filho. Abraão teve um filho anterior a Isaque, chamado Ismael, filho de uma egípcia de nome Agar. Os egípcios são descendentes diretos de Cão ou Cam, a partir de Mizraim. Os filhos do hebreu Abraão e da egípcia Agar estão na raiz da origem dos povos árabes. Por isso que atualmente as tentativas de pacificar o Oriente Médio leva o nome de “Acordos de Abraão”, porque ao final das contas, tenta-se pacificar dois povos que descendem do mesmo pai, como se o problema fosse unicamente de ordem geopolítica ou histórica. Não é, e vamos explicar porque não é. Do ponto de vista profético há dois agravantes, um em relação à descendência de Cão ou Cam, e outro em relação à natureza de Ismael, filho de Agar. Ambas são hostis e belicosas. De Ismael diz a Escritura: “Disse-lhe também o anjo do Senhor: Multiplicarei sobremaneira a tua descendência, de modo que, por numerosa, não será contada. Disse-lhe também o anjo do Senhor: Conceberás e terás um filho, a quem chamarás Ismael, pois o Senhor ouviu a tua aflição. Ele será como um jumento selvagem entre os homens; a sua mão será contra todos, e a mão de todos, contra ele; e habitará diante de todos os seus irmãos.” (Gênesis 16:10-12).

Deus deu a Israel a terra de Canaã, desde o princípio. Primeiramente informa Abraão (Gênesis 15:16), reafirma para Moisés (Êxodo 3:8), e finalmente confirma em Josué 3:10, à época da conquista. Entre Josué e Salomão, as fronteiras desse reino são solidificadas e delimitadas de forma clara. Mesmo depois da divisão entre os dois reinos, do Norte (Israel), com capital em Samaria, e do Sul (Judá), com capital em Jerusalém, os limites sempre estiveram ali. Cumprida a promessa, não havia mais o que discutir, pelo menos em tese. Os sucessivos reinados globais levaram Israel de arrasto. Egito, Assíria/Babilônia, Média/Pérsia, Grécia e Roma se apossaram, cada um ao seu modo, da Terra Santa, impondo suas formas de administração. Algumas mais tolerantes, como a do Persa Ciro e alguns momentos pontuais de Roma, e outras mais agressivas como em boa parte do domínio babilônico. Finalmente veio o advento do islamismo, e toda a narrativa de confrontos na região foi subvertida de forma catastrófica, porque nela foi inserido de forma mais crítica o contexto do radicalismo religioso, um perigoso fanatismo que mudou a configuração geopolítica da região para algo bem mais complexo. Os muçulmanos, ao contrário dos impérios anteriores, explicitaram o que vinha sendo tratado de forma subliminar por séculos: a importância transcendental de Jerusalém, o centro de tudo.

Quando o califado se impõe na região, entre os séculos VII e VIII, houve, a princípio, uma aparente liberdade de trânsito na região em relação aos locais sagrados, tanto por judeus como por cristãos, mas no ano 1009, no governo do terceiro Califa, El-Hakim, uma perseguição foi deflagrada e a Igreja do Santo Sepulcro foi destruída. Cerca de 70 anos depois Jerusalém foi verdade para qualquer um que não fosse muçulmano, o que ensejou o surgimento das Cruzadas, e o resto é história. Um conflito após o outro entre cristãos e muçulmanos, com o domínio passado por vários governos, até que em 1516 os otomanos vindos da Turquia se apossaram de Sião.

O sistema entra em ação, propriamente dita, durante a Primeira Guerra Mundial, quando, em 1917, tropas inglesas comandadas pelo general Allenby tomam Jerusalém do já combalido Império Otomano. Ali o “Império onde o sol nunca se põe” mostra a sua verdadeira face no tabuleiro geopolítico global. Ajudado inicialmente por árabes liderados por Faiçal, adversário dos turcos, os britânicos deram a entender a eles que lhes cederiam a Palestina. Puro engodo. Já existia um plano no underground, que viria a ser confirmado pela Liga das Nações sete anos depois da ocupação inglesa, que era a existência de um estado judeu na região. A Grã-Bretanha, subsidiada pela Liga, que viria se tornar a ONU tempos depois, usou a estratégia de dividir para conquistar e ludibriou árabes, judeus, palestinos e muçulmanos. Pelo que declarou um sábio judeu: “A Inglaterra prometeu um lar nacional ao povo judeu e depois esqueceu o povo ao qual fizera a promessa. Grupos comunistas fazem grandes promessas antes de chegar ao poder, mas depois esquecem rapidamente dos seus ideais humanitários.” (Irving Bunim, A Ética do Sinai). Alguém pode se perguntar: “O que tem a ver Inglaterra e comunismo?”. Minha resposta é simples: “Seja bem-vindo ao sistema”.

Se lançarmos um olhar completamente imparcial sobre a história milenar de Israel, com exceção à conquista de Canaã, não há um único relato desde Jesus Cristo para cá, ou seja, de cerca de dois milênios, de que os israelitas tenham iniciado um conflito fora dessas fronteiras ou mesmo que não tenha sido para se defender de ataques covardes e desproporcionais como ocorreu na Guerra dos Seis Dias em 1967 quando, atacado simultaneamente por Egito, Síria e Jordânia, países bem maiores, não só derrotou os três como anexou territórios de todos eles, em um episódio de proporções bíblicas típico da história israelense. Esse povo foi espalhado pelo mundo em sucessivas diásporas, perseguido em todos os continentes em maior ou menor grau, teve seus bens confiscado, suas famílias divididas, sua identidade manipulada, foi vítima do maior genocídio de guerra da história, e mesmo assim é visto como uma ameaça pelo sistema que atua nas sombras, e ninguém se detém por um instante para se perguntar o porquê. Hanna Arendt declara que “Se é verdade que a humanidade tem insistido em assassinar judeus durante mais de 2 mil anos, então a matança de judeus é uma ocupação normal e até mesmo humana, e o ódio aos judeus fica justificado, sem necessitar de argumentos” (Hanna Arendt. As Origens do Totalitarismo. Companhia de Bolso. 2018.).

O antissemitismo moderno migrou do Oriente Médio diretamente para a Europa e se transformou na mais brutal e complexa teoria da conspiração da história contemporânea. Tudo por conta de uma obra apócrifa feita sob encomenda no Leste Europeu, chamada “Os Protocolos dos Sábios de Sião”, uma peça de ficção que influenciou o pensamento do Velho Continente desde o final do século XIX, se valendo, de um modo diabolicamente estratégico, da posição privilegiada que meia dúzia de judeus, hábeis em seus negócios e operações financeiras, ocupavam na formação da moderna Europa. Narrativas fantásticas sobre meia dúzia de famílias judaicas que supostamente controlavam e economia global e a mídia vigente, se transformaram em matéria-prima para um conto sombrio que colocava os judeus, um povo que sequer tinha onde morar, no centro de um plano nefasto de dominação global. Historicamente falando, foi no seio da aristocracia prussiana do final do século XVII que começou a surgir aquilo que seria o esboço do antissemitismo como o conhecemos hoje. Nem precisamos esmiuçar a influência que “Os Protocolos” tiveram em uma mente insana como a de Adolf Hitler, que despejou sua psicopatia na obra “Mein Kampf” onde acusa os judeus abertamente de financiar a prostituição, ‘tráfico branco’ (seja lá o que isso significa), racismo, manipulação da mídia, propagação de pestes, e de serem eles os verdadeiros precursores do marxismo, uma ironia da história, visto que Marx de fato era de ascendência judaica, porém possuía verdadeira aversão pelos valores mais elementares e tradicionais de seu povo e sua história. Hitler, um demente de instintos selvagens, foi o idiota útil usado pelo sistema para morder a isca que desencadeou o caos. Ele acusou os judeus de marxismo, sem saber que os homens que patrocinaram loucuras como “O Manifesto do Partido Comunista” foram os mesmos que patrocinaram “Os Protocolos dos Sábios de Sião”. E todos estavam por trás da Liga das Nações, que veio a se tornar ONU. É só juntar as peças, agora. Quando Hitler diz que o grande problema do mundo novo é o “problema judaico”, ele fala pelo sistema que vê atuando nas sombras para destruir Israel desde sempre.

Quando você observa a atmosfera da Terra Santa, consegue captar por um instante o odor de pólvora pronto para ser incendiada. Vamos usar somente um exemplo a cidade de Belém, terra Natal do nosso Senhor Jesus Cristo. Aquilo ali sempre foi possessão israelita, desde os tempos de Davi. Aliás, o maior rei da história de Israel nasceu lá. Hoje, está em área Palestina, sob domínio árabe/muçulmano. Ocorre que Belém vive praticamente do turismo religioso, visto na cidade encontra-se o Complexo da Natividade, que abriga o local onde o Messias nasceu, o local da manjedoura, o lugar onde Jerônimo viveu e traduziu a Bíblia do grego para o latim, dando ao mundo a Vulgata, e o Campo dos Pastores, que teria sido onde os pastores foram avisados por um anjo do nascimento do menino. Logo, obrigatoriamente, estamos falando de um lugar cristão. E para ‘melhorar’, o Complexo é administrado simultaneamente por três igrejas cristãs: a Ortodoxa Grega, a Ortodoxa Armênia e a Católica Romana.

Entenda: é um lugar dentro do território de Israel, sob controle de árabes muçulmanos, que vive da fé que os cristãos do mundo todo tem em um… judeu. Há momentos em que todo esse pessoal se cruza pelas ruas estreitas e acidentadas de Belém da Judeia. O que queremos explicar é que TODO o mundo teoricamente monoteísta tem suas garras fincadas na Terra Santa e disputa palmo a palmo cada centímetro. Mas estamos falando de um país do tamanho do Sergipe, sem mananciais de água doce, sem grandes jazidas de ouro ou diamante, sem impressionantes reservas de petróleo ou gás, encravado no meio de um deserto, com fronteiras totalmente acidentadas e um histórico pouco convidativo.

Observe como o praticamente todo o universo fundamentalista do Oriente Médio respira terror em relação a Israel. Observe como a ONU sempre condena suas ações, mesmo que defensivamente justificáveis, ao passo que apoia incondicionalmente ditaduras sanguinárias que desrespeitam sistematicamente os direitos humanos, principalmente de mulheres e crianças. Observe como qualquer reação de Israel contra grupos terroristas é tida como desproporcional e genocida. Observe como contra Israel todo mundo pode tudo. E depois de observar tudo isso, pergunte-se: o que querem todos eles?

A histeria antissemita não pode ser explicada de forma natural. Não se amolda a realidade dos fatos, ao escrutínio da razão, por mínima que seja, como se possível fosse. A histeria antissemita é obra clara e acabada de um sistema diabólico que se sustenta em pilares humanamente incompatíveis, uma hidra hodierna com muitas cabeças que atendam por vários nomes, como comunismo, positivismo, progressismo, nazismo, ecumenismo, globalismo, etc., que tem como função pétrea extirpar do planeta todo e qualquer resquício da tradição judaico-cristã que existe. Uma função descrita em várias obras que alimentam a histeria, de forma clara ou subliminar. A histeria antissemita é sobretudo espiritual. E se você quer realmente saber quem está do lado certo ou errado da história, observe quem está a favor ou contra Israel. Essa régua não falha nunca.

Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. III N.º 41 – ISSN 2764-3867

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Sobre o autor

Neto Curvina

Ministro do Evangelho, teólogo, escritor e educador. Autor de “A Velha Desordem Mundial: a teologia do caos”.

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BIOGRAFIA

Leandro Costa

Servidor público, advogado impedido, professor de Direito, Diretor Acadêmico do projeto Direito nas Escolas e editor-chefe da Revista Conhecimento & Cidadania.

Defensor de uma sociedade rica em valores, acredito que o Brasil despertou e luta para sair da lama vermelha que tentou nos engolir. Sob às bênçãos de Deus defenderemos nossa pátria, família e liberdade, tendo como arma a verdade.

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