“A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”. Rui Barbosa.
Existe uma prática na qual se afundam navios para que sirvam como bases para o surgimento de corais, surgindo uma flora que abrigará e alimentará uma fauna marinha, criando ou expandindo assim um ecossistema rico. Não é a natureza do navio, mas é um bom uso para algo que se tornou inservível.
O chamado afundamento de navio é realizado quando a embarcação deixa de ser funcional, seja por um dano, pelo custo elevado ou pela obsolescência, reaproveitando a maior parte para a criação de corais, entretanto, os naufrágios decorrentes de acidentes e guerras foram a inspiração para tal prática, haja vista que, observou-se que as embarcações naufragadas acabaram se tornando abrigo para corais e, consequentemente, para a fauna marinha.
Não se trata do uso incorreto da embarcação, já que, para que sirva de base para os corais, o navio se encontra inservível para aquilo que foi projetado, portanto, é uma forma de aproveitar aquilo que sobrou, como um cadáver de animal que serve como nutriente para plantas na floresta.
Ao construir uma casa, o encarregado deve pensar na forma que aquele imóvel abrigará aqueles que o habitarão, como dormirão, usarão a cozinha, banheiro e outros espaços, entretanto, um construtor não está, em regra, preocupado com o mau uso do imóvel, ou seja, ele não constrói paredes macias para indivíduos que decidam bater suas cabeças ou uma tubulação de esgoto que permita ao morador jogar todo seu lixo pelos ralos, uma vez que, seria impossível antever a degeneração do uso, ou seja, que se dada função diversa daquela para qual a casa fora construída.
Igualmente, projetistas de automóveis não projetam seus veículos pensando naquele que, eventualmente, decida invadir uma área de passeio e passar sobre os pedestres. É certo que em grandes cidades, especialmente aquelas que sua população sofrera a corrosão pela cultura do lumpemproletariado, ou seja, tomada pelo progressismo revolucionário, sucumbiu ao culto à postura marginal, por vezes, indivíduos transitam em suas motocicletas pelo passeio sem o menor pudor, colocando em risco a vida dos que caminham pelo local, entretanto, tal bestializada conduta não pode ser prevista pelos construtores das motocicletas.
Culpar o fabricante pelo mau uso do equipamento impediria que facas fossem vendidas, o que, por si, deveria ser considerado como resultado de uma deficiência cognitiva inadmissível, logo, responsabilizar operadoras de plataformas digitais pelo conteúdo, ainda que seja abominável, inserido naquela determinada rede é igualmente estúpido. Evidente que no campo da desonestidade intelectual, no qual se pretende usar o mau uso para atribuir ao produto a culpa, de maneira que, buscam avançar com uma agenda que os é útil valendo-se de uma caso em que há clara corrupção do uso.
O caso recente em que uma menina de Brasília supostamente morreu em razão de um desafio proposto em uma rede social, serve de trampolim para que, mais uma vez, políticos autoritários ou incautos, tentem enfiar suas presas nas operadoras das plataformas digitais, algo que resultará em maior controle da informação, permitindo que o totalitarismo avance ainda mais sobre o povo brasileiro. Se por um lado, os incautos querem dar uma resposta rápida e não pensada para o caso da garota de Brasília, os déspotas aproveitam a oportunidade para, lançar sua nova tentativa de calar vozes dissonantes.
Aqueles com mentalidade totalitária lutam pelo controle da informação, posto que, ao centralizarem os meios de comunicação garantirão que somente as ideias que pretendam difundir sejam promovidas pela mídia mainstream, tendo em vista que, ao contrário do quê afirmou um determinado magistrado brasileiro, seria mais difícil que regimes totalitários, como o Nazismo, pudesse alcançar o poder com fizera na Alemanha do início do século passado, pois, se houvesse informação descentralizada, em verdade, a propaganda do partido poderia ser confrontada em um ambiente de informação livre.
Não por acaso, ditaduras como a chinesa e a norte-coreana não permitem aqueles que habitam seus domínios tenham acesso a argumentos, notícias ou registros históricos que possam confrontar aquilo que é considerado como versão oficial, que, em síntese, significa a versão que interessa ao regime.
A imprensa e mídia mainstream, comumente associada ao regime totalitário, servem como meio para unificar a informação e a cultura solidificando a versão oficial, logo, para qualquer regime autoritário, faz-se necessário o controle das narrativas afastando aquelas que não comungam dos interesses dos que ocupam posições de poder.
A grande mídia definha quando pode ser confrontada, não por ataques coordenados, mas por sua perda da capacidade de persuasão, haja vista que, quando apresentada uma versão mais detalhada, menos enviesada, dos fatos, poderá o receptor da mensagem julgar qual a mais verossímil, libertando-se do monólogo da besta que tenta vender sua narrativa como a única válida.
Não por acaso, a mídia mainstream defende com todas as forças aquilo que chama de regulação das redes, quando, na verdade, pretende calar todas as narrativas que não sejam a oficial, ou seja, a da mídia mainstream. Há projetos de lei que responsabilizam plataformas até por anúncios veiculados, entretanto, não existe a mesma exigência quando se trata da grande mídia. O objetivo, ao menos aparente, seria retirar uma receita das plataformas e redirecioná-la aos canais de mídia mainstream que, em conluio com o Estado, pretendem controlar aquilo que o cidadão pode saber.
A perda da capacidade persuasiva da mídia faz com que ele perca a sua função para os poderosos que, apesar de alegarem que se trata de um meio de entretenimento, usam a força do convencimento para manipular o povo, de maneira que, em havendo outras versões, mesmo as autoridades não poderão negar os fatos e impor sua narrativa mentirosa.
A melhor forma de destruir a desinformação é confrontá-la com a informação real, de maneira que, o meio mais eficaz de combater a mentira é expô-la, por tal razão, aos que insistem em dizer que o rei não está nu, restará calar todo aquele que se dispuser a dizer a verdade.
Enquanto a grande mídia luta para não afundar, fingindo que não há um rombo em seu casco, mais agentes independentes surgem para desempenhar seu papel, alguns se profissionalizando e outros se mantendo no amadorismo, criando algo positivo sobre aquilo que será o cadáver da mídia mainstream. O belo coral que surgira no lugar do navio afundado, dará um novo significado à liberdade de informação e, em breve, não haverá obstáculos aos que pretendem se expressar livremente, pois, cada um será um canal de informação e não será considerada válida qualquer vantagem que a antiga imprensa busque manter sobre os indivíduos.
No há motivo para lamentações, pois, a mídia mainstream morrerá para dar lugar a algo melhor que evoluiu naturalmente, não sendo obra de agentes revolucionários que tentam enfrentar a realidade, tampouco, de uma catástrofe. O fim da hegemonia da informação será benéfico e trará a verdade cada vez mais a lume, permitindo que cada um busque suas fontes conforme sua vontade ou interesse real pela informação.
A decadência da mídia mainstream advém do avanço tecnológico, da busca espontânea pela informação e, não podemos negar, de sua corrupção sistêmica, uma vez que, em sua maioria, a mídia mainstream decidiu se associar com o poder em um verdadeiro conluio para manipular as massas. Acostumada a mentir sem alguém para a contrapor e alimentando-se de somas consideráveis em troca de apoio, uma parcela considerável da mídia acabou se condenando ao distanciamento do mundo real e, consequentemente, dos indivíduos.
Ao afastar-se das pessoas em geral, a mídia perdeu-se em uma espécie de vale do qual somente os seus participam, acreditando que os sons que ecoam em seu vale são os únicos existentes, começou a falar apenas para os seus, ignorando o mundo que o cerca. Enquanto romantiza o banditismo em suas obras e discute ideologia de gênero a mídia finge não ver que o crime organizado massacra o povo e que a maioria sequer se importa com gêneros artificialmente cunhados para agradar hordas transloucadas de servos da revolução, mesmo a revolução é uma farsa que não convence.
Certamente, os corais que florescerão sobre o cadáver da mídia mainstream serão muito mais úteis e verdadeiros que seus navios, libertando as massas da cegueira imposta pelos impostores que os antecederam. Não há como negar que a perda da credibilidade da mídia é resultado de sua escolha pela desinformação seletiva em favor da revolução, seja por cumplicidade ou corrupção, a opção por enganar acabou se tornando o fator essencial para sua queda, considerando que o advento dos meios de comunicação independentes, fizeram com que boa parte do povo pudesse conhecer narrativas que se contrapunham às falácias do cartel midiático.
Por outro lado, a mídia mainstream pode aproveitar o afundamento do navio para florescer como um coral sobre sua própria carcaça, como fez os renomados jornalistas Alexandre Garcia, Augusto Nunes, Luís Ernesto Lacombe e outros tantos que preferiam a verdade à submissão aos desmandos das autoridades.
Infelizmente, a ideologia totalitária que pretende se impor através da mentira, não se furta ao uso da força e, conhecendo o poder coercitivo dos tribunais, cooptou as almas dos magistrados para que sirvam sua sinfonia da destruição. O Judiciário dissociando-se da justiça jogou seus valores na sarjeta para promover uma verdadeira caçada aos que não se curvam à sua ideologia dominante, tornando-se um ator político o qual sua essência não o permitia.
A revista britânica The Economist publicou artigos em que aponta para o poder excessivo do Poder Judiciário brasileiro, elencando como principais personagens alguns dos ministros do Supremo Tribunal Federal que não ousaremos mencionar em razão, justamente, de seus excessos, pois, diferente da The Economist, sediada em Londres, quem está sob o julgo de tais autoridades deve, segundo a própria revista, temer seus arroubos autoritários, ao menos por lucidez.
O Poder Judiciário que decidiu se tornar ator político, e não se resume ao STF, decidiu, assim como a mídia mainstream afundar seu próprio navio por se desviar de sua essência, posto que, a promessa da tripartição de poderes, ou funções, colocava tal poder como aquele a quem o cidadão recorreria diante de uma injustiça praticada por políticos ou demais autoridades, cabendo ao Judiciário, inerte e imparcial, se manifestar quando uma injustiça fosse levada à sua presença.
Um Judiciário que busca protagonismo, quando sequer deve aparecer no palco político, guardando o respeito por sua imparcialidade, acaba se destruindo, contudo, a função de dizer o direito é indispensável à sociedade, portanto, quando o navio afundar, e ele afundará, teremos que reinventar o Poder Judiciário, não na forma que os revolucionários queriam, mais poderosos e contaminado por sua ideologia, mas da forma que nos forçaremos a fazer devido aos seus arroubos autoritários, ou seja, menos poderoso e mais responsável.
A inconsequência das ações dos membros do Judiciário e do Ministério Público e a vasta gama de privilégios, quando sequer reconhecem como absurdo os ganhos muito acima do limite constitucional, imporá ao povo que os poderes, privilégios e irresponsabilidade afetas aos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público sejam discutidos e reestruturados, não para evitar que o navio afunde, mas para colocar outro navegando em sua rota.
Os restos do navio afundado servirá, assim como o Museu do Holocausto, como lembrete do quão é necessário limitar poderes de quem quer que seja, para que, no futuro, outros abusos não se repitam. O coral que florescerá sobre a carcaça do velho navio afundado, será a lembrança histórica às futuras gerações para que nenhum homem tenha tanto poder que não possa ser impedido de errar ou abusar de seus pares.
Devemos compreender que não devemos delegar poderes exorbitantes às autoridades, pois caso o poder corrompa, será necessário que freios sejam impostos. Para os que conhecem os heróis em quadrinhos, é bom lembrar que mesmo o personagem Batman guardava um pedaço de Kryptonita, para o caso do Superman se corrompesse pelo caminho, lembrando que Bruce Wayne não tinha poderes para, em um cenário normal, subjugar os demais membros da Liga da Justiça.
Será que chegamos ao ponto de enfrentar o alerta de Rui Barbosa e buscarmos meios de limitar os poderes do Judiciário?
“Os políticos e as fraldas devem ser mudados frequentemente pela mesma razão” . Dito popular, por vezes atribuído a Mark Twain (escritor e humorista americano) ou a Eça de Queiroz (escritor e diplomata português).
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Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. IV N.º 53 edição de Abril de 2025 – ISSN 2764-3867