A Batalha de Salamina ocorreu no ano de 480 a.C. e teve como envolvidos os povos gregos e os persas, sendo uma revanche por parte dos persas contra, principalmente, os atenienses, por terem frustrados as investidas anteriores, ao vencerem a Batalha de Maratona. O Rei Xerxes dos persas enviou parte de sua tropa por terra, mas, ante as dificuldades do terreno, optou por lançar a maioria de seus guerreiros em barcos, que partiriam da Ásia Menor, atualmente a Turquia, com destino à Atenas.
Após a vitória dos atenienses em Maratona, que se dera uma década anterior a Batalha de Salamina, foi profetizado pelo Oráculo de Delfos que sua cidade cairia perante um novo ataque dos persas, sendo lhes dito que protegessem em suas muralhas de madeira. Após longo debate, compreenderam que as referidas “muralhas de madeira” seriam embarcações, logo, os gregos deveriam levar a batalha para o mar.
Atenas deveriam construir um número de embarcações capaz de frustrar a invasão vinda da Pérsia, o que foi feito, mas havia um custa a ser suportado. O custo da guerra sempre foi impactante, mas perdê-la seria ainda um peso maior, por isso, decidiram construir a frota.
Durante a batalha, as forças persas foram consideravelmente atrasadas por terra, contudo, conseguiram chegar ao litoral ateniense, destruindo a cidade enquanto os cidadãos estavam protegidos em suas “muralhas de madeira”. O contra-ataque dos gregos destroçou os invasores que não tiveram condições de vencer a cidade-estado de Atenas e, por conseguinte, tiveram seu pretenso avanço por toda a Grécia antiga interrompido.
Temístocles, um líder à época, convenceu o povo de Atenas a construir o máximo de barcos que fosse possível, posto que, sabia que os persas não desistiriam após a derrota em Maratona. A mina de prata localizada ao sul da cidade de Atenas, chamada Mina de Laurion, que além do metal mais abundante, também era fonte de cobre e chumbo.
Um terceiro veio foi descoberto na região, tornando a mina grande fonte de riqueza, há quem defenda que poderia dar certo conforto a todos os cidadãos da cidade-estado, uma vez que, inicialmente a fortuna extraída de Laurion seria distribuída igualmente entre os atenienses. Tal destino fora decidido entre os habitantes e Temístocles teve de convencer cada um de seu povo a abdicar de sua parcela da riqueza, sendo necessário que todos confiassem a fortuna aos que dariam cabo da missão de construir os navios.
Os cidadãos atenienses abriram mão de uma considerável participação para que sua cidade-estado pudesse se defender dos persas, o que parece em um primeiro momento uma ideia coletivista, entretanto, longe disso, aqueles cidadãos deixaram suas ambições de lado para garantir a existência de sua sociedade, construindo uma frota naval capaz de vencer seus algozes. Nenhum dos atenienses aproveitaria seu quinhão se fizessem a escolha pelo imediatismo.
Ao repartir a riqueza de Laurion, Atenas faria de seus cidadãos mais ricos porém os condenaria a uma derrota quando da invasão vindoura, por isso, cada um teve que suportar a perda para construir as embarcações. No caso da Batalha de Salamina, os atenienses restaram vitoriosos, sendo certo que seu sacrifício foi recompensado pela sua sobrevivência.
Todavia, há alguns pontos que devem ser observados e trazidos para a contemporaneidade, para compreendermos o quão nossas ações podem impactar no futuro e que a busca por um retorno imediato pode nos custar caro demais.
Uma das questões centrais seria a atual ausência de patriotismo, bem como, da identidade como povo, que poderia levar os indivíduos à recusa em construir as embarcações, tendo em vista que, sem a menor preocupação em salvar nada além de sua própria pele. Imagina-se que nos dias atuais, mitos optariam pelos dracmas e simplesmente esbanjariam tal riqueza, ou mesmo, tomariam um rumo de posse dos valores.
A falta de compromisso com a civilização poderia ser tamanha que não haveria a renúncia às riquezas de Laurion em favor das futuras gerações. Basta observar quantos são os que se corrompem e deixam um legado nefasto, vendendo o futuro de seu próprio povo em nome de sua ganância.
A corrupção é, sem dúvida, uma chaga comportamental, que macula o caráter, mas está intimamente ligada ao desapreço pelo próprio povo. É doentio como um agente pode aceitar a corrupção tendo consciência de que o preço será a destruição do futuro, em síntese, aceitar um valor para seu proveito sabendo que um dia os persas chegaram.
Por outro lado, há também a desconfiança, pois como as autoridades são também cidadão, não se pode dar fé aos seus pares quando se sabe são tão corruptíveis quando todos os demais. Na realidade atual, confiar seu quinhão às autoridade não parece algo muito sóbrio, posto que, mutos daqueles que deveriam se dedicar aos cidadão são aqueles que se locupletam das coisas públicas, dos bens alheios.
Por fim, cabe-nos entender que nossas decisões são o que nos mantém de pé ou de joelhos e que sacrifícios serão exigidos em nome daquilo que consideramos maior, pois, para muitos, a Batalha de Salamina foi quem garantiu a existência de toda a civilização ocidental, portanto, devemos compreender que alguns combates não podem ser evitados e que pode haver um propósito maior em nossas ações, ainda que não possamos compreendê-lo.
A defesa da cidadania é a defesa da existência como indivíduo, o legado não pode ser um veneno para as futuras gerações e sim uma dádiva que brota do sacrifício. A maior prova de amor aos descendentes e honra aos ancestrais e deixar um mundo livre e justo como fruto de uma vida.
Herdeiros, que somos, da civilização ocidental, seguindo os exemplos dos atenienses, nos cabe honrar nossa história e lutar por um futuro na qual a civilização seja alicerceada em valores de justiça e liberdade. Que o povo brasileiro tenha a muitos dracmas, mas que saiba sempre que sua existência está muito acima, pois não será consumida se cada um fizer da liberdade, justiça e a fé sua “muralha de madeira”.