O mito de Narciso apresenta uma figura da mitologia grega que nascera na região grega da Beócia, filho do deus do rio, Cefiso, e da ninfa Liríope, sendo um indivíduo dotado de uma beleza divina, muitos o consideram o deus da beleza, tratando-se de um posto ocupado por Adones ou Apolo, dependendo da versão. Segundo a lenda, Narciso era tão belo que encantava até mesmo criaturas divinas, todavia, o Oráculo Tirésias fizera uma previsão na qual o detentor de tamanha beleza teria uma longa vida, desde que não olhasse para sua própria figura.
Narciso era arrogante, desprezando o amor de qualquer ser que tentasse o conquistar, como fizera com a Eco, uma ninfa amaldiçoada por Hera, Narciso desprezara todos que lhe pretendiam, entretanto, seu calvário seria o resultado de sua soberba, apaixonando-se pelo seu reflexo, teve um trágico fim ao ser, em sua imaginação, ignorado por tão bela criatura. A vaidade foi a ruína de Narciso, pois, apaixonando-se por seu reflexo, não seria correspondido, razão pela qual, seus dias terminariam em sofrimento e abandono.
O conto de Narciso, que deu origem ao termo narcisismo, um conceito da psicanálise que define o indivíduo que admira exageradamente a sua própria imagem e nutre uma paixão excessiva por si mesmo, nos ensina que a humildade deve ser sempre conservada e que a soberba é uma porta para o abismo, que destruirá o indivíduo em razão de sua vaidade excessiva. É importante observar que aos que ao soberbo restará a autodestruição, contudo, arrastará seus aduladores para o precipício, trazendo o mal a todos que o cercam.
No caso do mito, o ostracismo que Narciso se impusera, não por se julgar penitência ou por se considerar incompatível com a sociedade em que vivera, mas por se considerar mais que todos os outros, detentor de tamanha beleza que jamais repartiria, termo adequado ao imaginário da figura mítica, com quem quer que seja. Ao se afastar do convívio em razão de sua soberba, Narciso acabou por proteger terceiros, fazendo com que sua derrocada, ao menos em uma análise perfunctória, afetasse sua existência de forma singular, deixando de influenciar terceiros por sua vaidade, não os arrastando consigo. Evidente que a ninfa Eco não pode ser considerada como uma vítima da maldição de Narciso, posto que, tal destino trágico resultou da vingança da ninfa, que, desprezada pelo vaidoso homem, pediu que a deusa Nêmesis fizesse com que ele sofresse de uma paixão não retribuída.
O narcisismo, de forma bem diversa da apresentada no mito, pode envolver outros, pois, a autodestruição nem sempre ocorrerá precedida do ostracismo, sendo assim, poderíamos supor que Narciso morrera como um ser isolado, nem mesmo a lenda de lobos que se isolam para morrer se aplica ao mito. Há quem defenda que animais como lobos se afastam de seus grupos para que possam morrer sozinhos, não retardando a alcateia, deixando assim de ser uma espécie de fardo para o bando, entretanto, para isso, é necessário que exista um bando, o que não se aplicaria a Narciso.
Por outro lado, uma teoria diverge da ideia de lobos se isolando enquanto aguardam a morte, acreditando que tal afastamento, em verdade decorre da busca por proteção em momentos de fraqueza, sendo assim, o animal tentaria manter-se protegido por sentir-se fraco, bem como, há quem defenda que o ostracismo ocorre de forma mais natural, como resultado da incapacidade de um animal moribundo acompanhar o ritmo dos demais membros da alcateia, por estarem saldáveis. Como já observado, nenhuma das hipóteses apresentadas abarcaria o mito de Narciso.
Se a ganância e a vaidade podem destruir um indivíduo, também são capazes de atingir todo um bando, especialmente, se aqueles que guiam o grupo tornarem-se cegos pelo poder, assumindo que fins justificam quaisquer que sejam os meios. Ao focarem toda sua energia em sua doentia por, cada vez mais, poder, líderes despóticos são consumidos pela soberba, não como Narciso, mas como bestas que se alimentam de seus vassalos, levando à ruína todo aquele que trilhar em seu rasto fétido.
Natural que os primeiros nomes que venha a memória do leitor sejam de líderes totalitários, como socialistas, nazistas e fascistas, os quais chamaremos de revolucionários, simplesmente por se enquadrarem em tal espectro, uma vez que, através da imposição de regimes coletivistas, buscaram quebrar as sociedades em que viviam, alguns ainda o fazem, para tentar construir seu utópico universo que se resume a uma falsa promessa.
Não há dúvidas que líderes revolucionários são narcisistas, basta observar que a soberba se torna o combustível para suas ações, deixando evidente, por vezes em pouco tempo, que suas promessas nada tem a ver com suas reais intenções. Um bom exemplo é o falecido líder socialista de um país insular no Caribe que mantinha uma pequena ilha paradisíaca denominada “Cayo Piedras” (Pedras Caídas, em tradução literal), ostentava relógios suntuosos, mas pregava que sua revolução fora em nome dos mais pobres.
O mesmo comportamento pode ser observado em outros senhores da revolução, falsos profetas que se banqueteiam enquanto jogam migalhas aos miseráveis que desprezam, entretanto, são adulados pelos seus seguidores, seja pela total ignorância, pela dependência, ou no pior dos cenários, por serem um norte daqueles que, se tivessem a oportunidade, beberiam também do sangue dos mais fracos como se fosse o néctar da ambrosia, como um parasita de luxo que desdenha de seu hospedeiro.
Caberia também relembrar da fábula do Flautista de Hamelin, que usou de sua capacidade para encantar ratos e livrar a cidade das pragas, entretanto, ao não ser recompensado, faz de tal dom seu instrumento de vingança para punir os cidadãos, levando suas crianças. Como não comparar tal figura com atuais influenciadores, autoproclamados criadores de conteúdo, que buscam aceitação em meio ao estamento e a mídia mainstream, oferecendo como sacrifício, às citadas entidades malignas, sua horda de seguidores.
Uma espécie de liderança, ainda que artificial, capaz de usar, sem o menor pudor, seus seguidores como moeda de barganha com aqueles que espia com superiores, para conquistar seu lugar no Olimpo. Desprezíveis figuras, em sua maioria idiotas úteis com pedigree, cuja função, aos olhos dos verdadeiros senhores da revolução, se limita a induzir uma massa, moral e intelectualmente debilitada, para que assimile suas narrativas como verdades e seus “valores, artificialmente criados”, como princípios que os levarão ao abismo.
Alguns dos flautistas, encantadores de zumbis, serão recompensados pelos mestres da revolução, recebendo afagos enquanto sua utilidade durar, todavia, ao perderem sua serventia, o descarte será seu justo destino, vivendo da memória do que um dia acreditaram ser, ou, rebelando-se diante da constatação que foram usados e dispensados. Por vezes, sua influência é drenada durante o processo, sendo esvaziada ao passo que são assimilados pelo sistema que buscaram integrar, é uma armadilha como o reflexo de Narciso, pois, fascinado por sua ascensão, tal criatura acaba colhendo os frutos de suas ações, posto que, acaba fagocitado em sua busca de fusão, deixando sua essência ser consumida por seu deslumbre.
Imaginemos uma celebridade faça tudo ao seu alcance para se juntar aos mais famosos, integrar uma grande rede de mídia, ao ser assimilado por tal grupo, se vê deslocado, “na geladeira”, em um lento processo no qual sua fama é absorvida pelo grupo. Qualquer semelhança com criaturas reais, não é mera coincidência.
Ao perceber que sua utilidade se esgotou e, por isso, será descartado, o aspirante a olimpiano tende a adotar medidas desesperadas, seja para postergar sua “vida útil”, buscando permanecer sob os holofotes, não importa o preço, ou se rebelando tardiamente contra o sistema que alimentou enquanto a troca era interessante para outros. O flautista, que perdeu seu encanto, tentará uma nova melodia para trazer mais crianças ao sacrifício ou optar por reivindicar as crianças que outrora oferecera em troca passaporte que lhe franqueara acesso aos palácios dos senhores da Torre de Marfim, hipótese que, em regra, será massacrado pelos senhores aos quais jurou vassalagem.
Idiota útil é, necessariamente, aquele que serve ao tirano acreditando pertencer ao ciclo dos poderosos, porém, sua vassalagem não lhe concederá tal direito, será sempre um pastor de zumbis servindo ao mal, seduzido por sua própria fraqueza. Quando não puder oferecer mais sacrifícios aos seus senhores, o encantador de almas perdida enfrentarão o desprezo e um trágico fim, percebendo-se como o ser vazio que é, como um corpo sem alma, pois a sua própria foi o primeira entre todas as que sacrificou em busca de uma beleza inalcançável.
O final trágico de Narciso aguarda todos os que se deixam seduzir pela ganância, acreditando que a revolução os elevará ao paraíso, cegos como Ícaro, que se deixou encantar pela emoção de voar e, aproximando-se do belo sol, teve suas asas derretidas e morrera após fracassar em sua travessia. Deixou sua vida e liberdade em troca de breve relance de contemplação, fascinado por uma beleza que era inalcançável, como o reflexo para Narciso.
O mais preocupante, entretanto, não são os que escolheram servir aos líderes revolucionários movidos por sua ganância, os mercadores de almas não são menos vis que seus mestres, tanto que, almejam se tornar aquilo que seus senhores são, como Sauron ansiava ser como Morgoth (Melkor). Nefastos como seus líderes revolucionários, os encantadores de zumbis farão tudo o possível para se tornar mais um entre os senhores do mal, pois, seu sonho doentio é colher os louros da revolução, sacrificando seus incautos seguidores para tanto.
A maior parte das figuras pútridas que se prestam a tão labor, em verdade, serão deixadas ao léu no decorrer da história, haja vista que, tornar-se-ão inservíveis e perderão seu encanto. Quando a flauta não mais puder seduzir os zumbis, as asas derreter-se-ão e a queda será fatal.
Voltando aos que, de fato, merecem a preocupação, voltamos os olhos para os que apresentamos como zumbis. Seres esvaziados de fé, moral, cultura e mesmo capacidade cognitiva, reduzidos ao elementar, pois, privados do mínimo, habitam o sopé da Piramide de Maslow, incapazes de buscar liberdade, quando sequer podem esmerar um futuro. A degradação cultural levou inúmeros indivíduos à condição de lumpemproletário, relegando-os ao abandono civilizacional, sobrevivendo como animais selvagens.
Vítimas de um ensino deficiente, mais preocupado em incutir pautas progressistas nas mentes dos alunos, de uma sociedade degradada e, ainda mais grave, da romantização do crime, os zumbis acabam servindo de banquete para seus encantadores, uma verdadeira horda dos desalmados, que sorve do sangue dos mais fracos com promessas de pão e vinho, ou picanha e cerveja, fazendo do entretenimento vulgar mais uma das amarras.
Os instrumentos mais utilizados para reduzir o homem à condição bestial de um zumbi, são a promiscuidade, as drogas e a assimilação por grupos identitários ou facções, que acolhem o frágil ser que busca pelo sentimento de pertencimento. Assim, de torcidas organizadas ao ativismo progressista, hoje quase sinônimos, os bandos aglutinam pessoas que líderes revolucionários podem facilmente manobrar, prometendo-os quaisquer migalhas ou simplesmente afagos em discursos vazios.
A revolução escraviza qualquer um que se apresente fragilizado, tendo em vista que, todo revolucionário é um vendedor de ilusões e todo indivíduo aquebrantado é um faminto implorando por ilusões que o faça acreditar que há um futuro de esperança mesmo para quem insiste em cavar, cada vez mais, sua sepultura em meio ao esgoto. Buscam quem diga-lhes aquilo que querem ouvir, mas fogem da verdade que precisam conhecer, perseguem mentira como meio de alcançarem o alento por suas ações, acreditando que as consequências podem ser adiadas.
Os agentes revolucionários são mentirosos em sua essência, por isso, cooptam os que buscam soluções fáceis ou que se encontram sem norte, destruindo os valores de uma sociedade e produzindo ainda mais seres fragilizados, ao ponto de reduzi-los à condição de lumpemproletários, em síntese, zumbis que podem ser arrebanhados e sacrificados em nome da causa.
Atraídos pela armadilha como insetos, serão mortos buscando a bela luz que acreditam ser seu destino, como o reflexo de Narciso ou o sol de Ícaro, destruir-se-ão deslumbrados por aquilo que nunca poderão tocar, vítimas da ignorância e das mentiras de seus encantadores, alimentarão, em sacrifício, os senhores da revolução.
Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. II N.º 28