Retrato do velho

Retrato do velho

Bota o retrato do velho outra vez?

No carnaval de 1951 a marchinha “Retrato do velho” empolgou o povo que lotou as ruas do Rio de Janeiro. A empolgação da população carioca, assim como em muitas outras cidades do país, se dava por causa da eleição de Getúlio Vargas no pleito de 1950. Mais uma vez, Vargas ocupava o Palácio do Catete e de lá pretendia dar continuidade a seu projeto de governo, interrompido em 1945 com sua renúncia.

Em verdade, desde sua saída do cargo, parte da população pedia o seu retorno. O queremismo movimentou os noticiários e manteve acesa a chama da esperança de um povo já acostumado com a “figura paterna” que ocupava a presidência. É fato incontestável que a longa passagem de Vargas pela presidência, deixou marcas profundas no imaginário popular e na maneira como o povo entendia o que seria a figura de um presidente.

Seus governos, conhecidos nos livros de história como a Era Vargas, foram e continuam sendo o molde para governos e governantes até a atualidade. Suas “façanhas” políticas pautadas pelo populismo, pelo nacionalismo exacerbado, pelo controle dos meios de comunicação, pela censura, prisões, mortes, desarmamento civil e culto à sua autoimagem, são o arquétipo do fascismo em sua mais genuína configuração. Fascismo, palavra tão deturpada atualmente que, de regime de governo com características bem definidas, passou a mero instrumento de agressão verbal, vazio de um verdadeiro sentido.

O retorno do retrato do velho às paredes das repartições públicas em 1950, representou a vitória de um modelo de país que havia nascido sob a promessa de restaurar a democracia e o federalismo, mas que contraditoriamente, hipocritamente, apenas substituiu uma oligarquia por outra. Estruturou e instrumentalizou os sindicatos para servirem à capilarização do poder estatal, chegando às mais recônditas regiões. Ora, a que fins serviam o coronelismo e seus coronéis senão aos mesmos? Para os fins a que se prestaram inicialmente, os sindicatos eram uma nova forma de coronelismo. Com o agravante de cooptar o operariado urbano e trabalhadores rurais, com benefícios trabalhistas que engessaram o crescimento industrial, mantendo o país completamente fora de qualquer possibilidade de competição real pelos mercados internacionais. A concessão de tais benefícios, comparada à antiga prática de panem et circenses (pão e circo), não nos parece tão absurda quando analisada quanto aos seus objetivos tácitos. Se a população de Roma se contentava com a distribuição de trigo no Fórum e se alegrava com o Circus Máximus, mantendo-se pacífica no trato, de igual modo a classe trabalhadora sob Vargas, mantinha-se bovinamente pacífica, crendo-se protegida pelo Estado, viviam a ilusão de estar em situação privilegiada. Tangidos pelos sindicatos, sua capacidade de reação ao entorpecimento estatal era mantida praticamente nula.

Seu retorno à chefia de Estado se deu com 48,7% dos votos do eleitorado. Mas desta vez sua passagem contaria com a oposição ainda mais direta e ferrenha de Carlos Lacerda. O jornalista e sua Tribuna da Imprensa moíam diariamente a imagem autoconstruída de Vargas, apresentando denúncias, promovendo matérias investigativas que exibiam dia a dia a podridão do governo. Sim, houve tempo em que a imprensa informava e não deformava a opinião pública. Tivemos na imprensa nacional homens de valor que não se vendiam aos interesses mesquinhos da politicagem.

O atentado a Carlos Lacerda em cinco de agosto de 1954, promovido por Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoal do presidente foi possivelmente, o fechamento do tambor da arma que apontava para o coração de Vargas. Em vinte e quatro de agosto daquele ano, a culminância de uma sequência de tragédias para o país ocorre: o suicídio do presidente, que o retirou da vida, mas não destruiu o seu legado, ao contrário, o fortaleceu. O ato final de Vargas não representou apenas sua saída da vida pelo suicídio, mas uma espécie de ritual final para sua própria mitificação e perpetuação de seu projeto ditatorial.

A questão fundamental neste artigo é se o povo brasileiro permitirá (por omissão) que se bote o retrato do velho outra vez nas paredes. Desta vez, Vargas não retornará, mas seu legado permanecendo vivo nos modelos esquerdistas de governo, mantém a ameaça do retorno. O velho agora é outro, tão astuto e velhaco quanto seu modelo, não vem de São Borja, mas de Garanhuns. O senhor Luiz Inácio Lula da Silva, ‘descondenado’ por seus crimes contra a nação brasileira, pretende retomar suas velhas práticas. Defensor do Estado gigante que tanto atraso e estagnação tem impingido ao país; do patrimonialismo muito ao feitio das matrizes socialistas; do controle social por meio de programas assistencialistas e de cunho populista; da censura ao direito de livre manifestação do pensamento; do desarmamento civil; entre tantas outras promessas que têm feito nos últimos meses. É de estarrecer que suas propostas ainda encontrem ouvidos dispostos a acolhê-las.

Se Vargas ainda fosse vivo, teria orgulho dos pupilos que formou, cujo exemplo mais óbvio é o senhor Lula, mas não se pode esquecer de Ciro Gomes que em nada perde quanto ao seu fascismo ainda mais explícito e despudorado.

Triste sina a de um presidente que defende pautas cristãs, os valores da família, o liberalismo econômico, a autonomia de seu povo e a liberdade em todas as suas vertentes. Triste e difícil é a jornada de conduzir um país ainda estruturado e aparelhado sob o modelo fascista de Vargas, que tem em grande parte de sua elite política e funcionalismo, apoiadores deste modelo retrógrado e estatizante. O retrato do velho Lula, tampouco o de Ciro Gomes, podem emporcalhar as paredes das repartições Brasil afora. Retornar ao passado é caminho de destruição para os defensores da liberdade, mas de igual modo aos incautos defensores do fascismo. Sim, eles que hoje tramam a volta da quadrilha ao local de seus crimes, serão em algum momento do futuro possíveis vítimas de seus guias. Criminosos não têm amigos, tem comparsas, e semelhante categoria trai e corrompe ao ímpeto de seus interesses pessoais.

Um modelo que em quase cem anos manteve o Brasil em marcha lenta, com índices de educação, atendimento à saúde, saneamento, tecnologia e industrialização tão abaixo do mínimo esperado, diante do volume escorchante de impostos cobrados. Impostos que, como sabemos, servem mais à manutenção da estrutura que a seus objetivos fundadores. Um sistema assim não pode ser continuado pois já deu provas mais que suficientes de sua ineficiência. O Brasil e seu povo merecem retratos melhores.

A corrupção que se tornou institucionalizada nos anos dos governos de Lula e Dilma, o compadrio espúrio do governo com a velha imprensa, o dinheiro público atendendo aos interesses de outras nações, tudo isso nos faz lembrar a saudosa voz de Lacerda, que deveria inspirar nossos parlamentares de hoje. Suas palavras proferidas em 1953, são tão atuais quanto se tivessem sido ditas hoje.

Meus amigos, nós partimos para o que parecia ser uma cruzada pela liberdade de imprensa e acabou sendo uma cruzada pela libertação nacional.

E isso não se deu por acaso. que quando se quer envenenar uma nação, começa-se por envenenar as fontes do conhecimento público, começa-se por envenenar as fontes de informação, sem as quais o povo não sabe o que se passa, ou, pior ainda, só sabe errado aquilo que se passa certo.

É através da corrupção da imprensa, é através da intimidação da imprensa, que se acaba por corromper e intimidar a própria opinião do povo.

Se montou no Brasil, não foi apenas um negócio para um grupo de afilhados do poder. Não foi somente um negócio feito à custa da miséria e do espoliamento do povo. Foi também um negócio para destruir no povo a confiança na democracia.

Foi um negócio feito para fazer o povo descrer de si mesmo, para fazer com que o povo pensasse que de nada valia protestar em praça pública, porque os homens do poder pensariam por ele e por ele agiriam desde o começo até o fim. (…) Ora, muito bem, até que enfim o Sr. Getúlio Vargas pretende punir corruptos e corruptores! Mas onde, onde estava ele quando a corrupção campeava? Que fez ele quando as portas do Banco do Brasil se abriram para dali sair o dinheiro com que um estrangeiro e um aventureiro se locupletaram? Que ele compreenda! Que ele compreenda que se a maioria relativa dos brasileiros lhe deu um respeitável voto de confiança, já que ele não pode corresponder a essa confiança, corresponda ao menos ao seu sentimento de respeito por si mesmo, e não se desrespeite. Nós não queremos desrespeitar no senhor Getúlio Vargas a figura do presidente da República. Para isso é indispensável que ele tire o seu filho dessa sujeira! É indispensável que ele promova imediatamente a punição daqueles que envolveram seu filho nessa sujeira! É indispensável que ele deixe de panos quentes e ele, que não teve escrúpulos para rasgar uma Constituição, rasgue a ‘Ultima Hora’!”

Com pequeníssimas adaptações, este discurso poderia ser dirigido ao velho Lula. Diante da repetição cíclica dos fatos, envolvendo sempre os mesmos ideais, não nos furtaremos ao dever de afirmar: em definitivo, não botaremos o retrato do velho nunca mais!

Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. I N.º 11

Sobre o autor

Mauricio Motta

Mauricio Motta - Professor licenciado em História Pós-graduado em História do Brasil e colunista na Revista Conhecimento & Cidadania.

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BIOGRAFIA

Leandro Costa

Servidor público, advogado impedido, professor de Direito, Diretor Acadêmico do projeto Direito nas Escolas e editor-chefe da Revista Conhecimento & Cidadania.

Defensor de uma sociedade rica em valores, acredito que o Brasil despertou e luta para sair da lama vermelha que tentou nos engolir. Sob às bênçãos de Deus defenderemos nossa pátria, família e liberdade, tendo como arma a verdade.

É preciso fazer a nossa parte como cidadãos, lutar incessantemente por nosso povo e deixar um legado para as futuras gerações. A política deve ser um meio do cidadão conduzir a nação, jamais uma forma de submissão a tiranos.

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